mandei poemas a uns amigos
sobre como Deus deixou
de existir a si mesmo
e eles não entendem
como pode ser tal
coisa
então expliquei
certa vez
Deus chegou junto de
si
e pensou
pára de existir-me
não posso pedir-te que venhas comigo. nem posso pedir-te que vejas o mesmo que eu vejo. cada qual transporta a si mesmo. também não posso pedir-te que saibas do que eu sei e que todos os dias me acontece desde há muito. repara: estou cego e um cego não pode pedir aos outros que vejam o que ele mesmo não sabe que vê.
do livro "Onde" (2001)
Sentei-me entre os
calmos animais da
terra
e vi que estavas
entre eles
e depois deles,
e que o teu peso
vinha das coisas,
embora por dentro as
suportasses,
e que havia uma
clareza nos animais,
uma ignorância de não
saber
nem querer,
o encanto de existir
apenas
sem porquê,
e que eram claros os
seus olhos
e os gestos,
e que no seu coração
uma luz
havia
e eras tu.
creio em tudo o que cai
creio na harmonia do chão
e seus derivados
creio nas formigas
não creio na gramática
do que está em cima ou voa
pois tudo os atrai para baixo
mas creio no silêncio
que é uma criatura do chão
assim os insectos
que se movem entre as coisas
e as tuas mãos de lama
creio no pó das estradas