poesia, Carlos Lopes Pires

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

                     (prece para o dia de todos os santos)

que tu me ouças

e não leves mais ninguém
do meu quintal

que fales
na minha boca os seus nomes
e assim os protejas da dor
e ausência

que nas suas mãos e coração
apenas tomilho e açafrão

e não deixes
mais lugares vazios

quinta-feira, 18 de outubro de 2018


tem compaixão de nós
senhor
 
que somos animais aflitos
e sem regresso

e construímos erguemos fazemos
 
mas por dentro somos
vazios e desertos

 

sexta-feira, 12 de outubro de 2018


                           oração

porque estás acima do mundo

das misérias e dos muros
de tudo aquilo que me prende e dói

e acima do mundo
quando olho alguma coisa
nos teus olhos

e me parece que tudo
é então tão grande

que nas tuas mãos deixo o cansaço
e as feridas que trago da cidade

o que chamam realidade
os papéis os compromissos
as portas e as datas

e sigo então as asas das gaivotas
que me dizem

que só tu estás
acima do próprio mundo
                         (in a noite que nenhuma mão alcança)
 

terça-feira, 9 de outubro de 2018


poeta

lentamente o orvalho
as casas guardando o quente bafo
dos animais

as árvores sossegadas
as aves escutando os barcos
em silêncio nas docas

mas tu
ó filho de ninguém
tu vives nas mágoas
e em todas as bocas

                (poema impublicável) 

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

            (para nunes e zaida)
 
aos amigos
desejamos o melhor

temos pensamentos de cuidados
para que as rosas durem sempre

aos amigos damos as mãos
em segredo

e é também em segredo
que usamos as palavras
com cuidado

em certas noites
sentamo-nos junto deles
e ficamos calados e quietos
a sentir o mistério que há lá em cima

até que um dia
se  move alguma coisa nas estrelas

e ficamos todos em silêncio