poesia, Carlos Lopes Pires

quinta-feira, 1 de março de 2018

(Extractos)

Um poema dirige-se, antes de mais, não àquele que o lê (o leitor), mas àquele que o escreveu. Interroga-o. Interroga-o a partir do seu silêncio. E esta interrogação provoca-lhe um estranhamento e um sobressalto. Estranhamento e sobressalto são essenciais para o carácter encantatório que caracterizam o poema digno deste nome. E porque o encantamento abre o silêncio, não o fecha, ele inaugura no mundo uma presença, mais precisamente, a daquele que anda lá fora na chuva. Aquele que nunca dorme.
Mas quem é o poeta? Digo que poeta é aquele leva o poema consigo. Aquele que o leva numa algibeira ou talvez no coração, e que o leva para onde quer que vá, o transporta e carrega. E onde quer que vá o edifica no meio dos outros homens, como a palavra que traz em si uma iluminada revelação. O poeta é, pois, um estrangeiro. É estrangeiro, porque essa é a condição daquele que carrega o poema: aquele que é estranho a si mesmo

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